por Padre Alexandre Santos
NB: As citações conservam o português da época
A História da Senhora da Rocha
Tudo começou naquela manhã de Domingo, dia 28 de Maio de 1822, quando um pequeno grupo de adolescentes do vale do Jamor se deparou com um coelho que lhes surgiu no caminho. Tentando alcançá-lo rapidamente se deram conta que os seus esforços pareciam infrutíferos. A agilidade e rapidez deste roedor em alcançar esconderijo, levou estes jovens a descobrirem uma gruta ali tão perto e tão bem protegida de silvado e de um emaranhado de salgueiros. Uma vez lá dentro depararam-se, espantados, com uma grande lapa funerária. Este achado a todos colheu de espanto e surpresa. Mas o melhor ainda estava para acontecer.
O boato e os comentários de uma gruta desconhecida, contendo ossos humanos, circulam por toda a região de Carnaxide e de Linda-a-Pastora. Mas será só ao terceiro dia que ocorre a grande novidade. Enchendo-se de coragem, resolvem apurar a verdade. E uma vez dentro da gruta, acendem tochas e vislumbram não só algumas ossadas humanas, como também uma pequenina imagem da Virgem, a quem deram o nome de Nossa Senhora da Conceição da Rocha. Tomás Ribeiro, o grande impulsionador e defensor da construção de um Santuário para esta imagem, assim refere:No dia 28 de maio de 1822, perseguindo um coelho que alli se escondera, entraram na gruta do Jamor percorrendo de rastos a furna por onde elle entrára, sete rapazes que andavam brincando e chapinhando nas margens e nas ilhotas de Jamor. Os seus nomes são: Nicoláo Francisco, Joaquim Nunes, Joaquim Antonio da Silva, Antonio de Carvalho, Diogo, José da Costa e Simão Rodrigues. Os mais novos tinham 11 annos, 15 os mais velhos. Entrando e recuando apavorados, no que levaram longo tempo, conseguiram emfim chegar onde puderam erguer se e respirar. Sondando e apalpando acharam e tomaram nas mãos ossos humanos como poderam verificar quando voltaram ao rio. As familias que ha muito os esperavam em suas cazas não receberam bem os retardatarios e não crêram mesmo na historia phantastica do descobrimento.
No dia seguinte porém começou de levantar-se e avolumar-se nos differentes logares donde eram naturaes os pastoritos, o boato da existencia d’uma gruta desconhecida, e a apresentação dos ossos e a insistencia dos exploradores foi firmando, se não certezas, desejos de apurar a verdade. No dia 30 bastantes pessoas acompanhando os retardatarios da ante-vespera ao rio, abrindo as franças dos salgueiros acharam uma lura na grande rocha que se afundava no Jamor.
Não ousaram porém aventurar-se, os mais prudentes; mandaram entrar os rapazes com ordem de trazerem outros ossos. Era a prova evidente de que elles disseram a verdade. E desde que a conheceram destinaram para o dia 31 procurar com luz que dentro accenderiam, o que podesse achar-se na gruta onde era certo haver estado gente. No dia 31 foram pois, com tochas, para dentro serem accendidas. Entraram na frente os sete moços, lá d'outros acompanhados, e accesa uma tocha, encontraram a pequenina imagem da Virgem.»4Frei Cláudio da Conceição, cronista do reino5 e grande apologista da Senhora da Rocha, também naqueles dias aí se deslocou para ver o sucedido, e refere que, na tarde do dia seguinte, a imagem da Senhora desapareceu de forma misteriosa. Gerou-se grande tumulto e inquietação vindo a ser encontrada no dia 4 de Junho sobre uma oliveira, ali perto, e por ordem da autoridade foi reposta na gruta, alumiada e guardada pelas forças da autoridade por ordem do Juiz de Fora de Oeiras.
O achado desta pequena imagem de barro da Virgem Maria6 é rapidamente divulgado por todo o Jamor e regiões circunvizinhas, chegando mesmo aos ouvidos do rei D. João VI. O entusiasmo popular rapidamente fez deste espaço um lugar de peregrinação e de devoção mariana. As romagens de fiéis, vindos de muitas partes da região de Lisboa e seu termo, da Estremadura, de outras partes do país, bispos, religiosos, nobres da corte, ricos e pobres sucedem-se de uma forma rápida e surpreendente.7 Diz-nos o referido cronista do reino:
«Este descobrimento he o brilhante Sol da protecção de Maria que vem inundar todo o Reino de Portugal com suas benignas influencias.»8
«Apenas appareceo a Imagem da Senhora da Conceição da Rocha, todos correm a tributar-lhe os seus cultos; a sua vista lhes infunde a maior compunção, olhando para si vendo que nada merecem, olhando para o Reino vendo os males que sofre, os insultos que se fazem á Religião, olhando para Maria, e vendo que ella póde desfazer tantos males, todos se compungem e derramão lágrimas na sua presença.
[...] No interior do seu Templo se offerece á vista o mais formoso, e o mais agradável objecto, vendo innumeravel multidão de fiéis arrebatados de huma intensa, e fervorosa devoção, humildemente prostrados ante o respeitavel, e sagrado Altar, onde se acha collocada a veneranda, e milagrosa Imagem da Senhora da Conceição da Rocha, agradecendo a torrente de graças, e benefícios que liberal, e benignamente lhes dispensa pelas suas mãos preciosas incomparavel Protectora.»9
